6.08.2011

ONDE É QUE CABE



Onde é que cabe, amor
(sobretudo 'onde caberá ' é que eu pergunto)
esse desacerto miúdo
esse eloquente desconforto
   (cavalo de tróia
     em xeque desafia
     as demais delicadezas)
para onde o passo em falso do pé quebrado do meu verso?
cá dê cadência,
ó meu versinho em seu lirismo abestalhado!
Não sei, amor,
se há de haver mundo onde tanta palavra
(reflexo e referência)
Entre tanto concreto
haverá chão onde brote o grelo pálido do que eu digo?
Se o meu verso, amor,
substância se fizesse
- coisa a se colorir de mundo,
           a se madurar de tempo -
o meu verso não seria esse joguete de espelhos entristecidos
Ele seria enfim verso livre
límpido e vivido
habitado mais por caracóis que por conceitos metafísicos.




Mas aí, amor, seria como se diz:
eu não seria eu e seria aquela
uma capaz de desabotoá-lo
até um desabotoamento de pássaro
(de um modo que você nem fizesse caso)
eu seria então aquela
que tem o coração como um poleiro
apto à distração e ao descanso
de sua natureza azul cinza de sanhaço.


Aí não seria eu essa
que leva em si o vidro
de um coração de aquário
(carecendo sempre de sal e limpeza
transbordando em nome de mais oxigênio)




este aquário:
objeto ansioso por estilhaçar-se no oceano
e ser leito carinhoso
pro molusco e pra baleia
e dissolver enfim
em amor e redemunho
a poeira dos naufrágios.



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