se a nossa carne
paisagem
morro azul
(para lembrar aos rapazes)
Meu amor:
às vezes soa em mim um desconsolo imusicável
e é difícil insistir
no alinhavar dos fatos
(esse que ajunta siso e insondável)
amor,
é claro que eu quero que teu braço descanse
assim amiúde à roda da minha cintura
quero ser mulher-amor-amante
antes que seja tudo minério à nossa volta
quero ajuntar os fios
firmar a costura
antes que seja demais o frio
me quero sim criatura clara e leve
capaz de canto manso e mão aladas
apesar dessas querências todas, meu amor
é preciso explicar-lhe a natureza de alguns desvarios
que me desatam desconsolo:
com aquele outro eu aprendi nos olhos dos cães um redondo
um redondo-ido
tão denso que se iça à paisagem
(foi assim que eu amei tanto aquele outro,
que me roubando me deu tanto)
eu, quando me enfrento
e me desentendo
ante o ruído obsceno e esnobe dos objetos
e dos homens e dos nomes que eles possuem
não compreendo nada, amor,
que não seja solidão e hortaliça
quero então meu olho dissoluto
nisso a que paisagem se chama
para conhecer enfim algum sossego
e segredo na perspectiva
por isso, meu amor, não te aborreças
se te pareço obtusa
assim emocionada ante os olhos dum carneiro.
esse carneiro, amor,
tão miúdo, berro e cascos
humilde se presta à tosquia
bem como ao prato e ao pastoreio.
esse carneiro, amor,
tem no olho pura íris
e o redondo-ido nele é orbe, amor, lagoa
de lua plena e negra.
me perdoa as lágrimas, amor,
mas não esquece
até posso ser a da ciranda e da cantiga,
atenta e bela.
mas no ôco onde carregarei teu filho
levo comigo
solidão e hortaliça
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