5.06.2011

SENHORES









SENHORES,
 - me lêem assim, como se diz, todo ouvidos?
finíssimos convivas nem hesitam
logo dizem: sim.


   Há então que erguer o tom
   para assim vencer a cera que lhes entope o meio.
   Uma vez rendido vosso ceroso coração,
   há ainda que afiar a voz até o mais agudo
   para que alguma mínima partícula dela ressoe íntegra
   dentro de teu peito entulhado
   pelas cegas ferramentas que se batem.


  Em meio ao banquete da ferrugem
   à bigorna, ao martelo, à cóclea
   sobretudo ao cerebelo
   eu pergunto:
         onde o fio?


      (nenhum fio metafísico,
        mas o gume mesmo
       que lhes honra a metálica natureza
       que justifica a presença do seu nome
       entre as prateleiras da oficina)


Os convivas satisfeitos
coçam suas barrigas
alisam peitos e orelhas.
Generosos, condescendem desenganar-me:
muito inteligentes estamos todo olvidos
bem assim como pediste.
Volta sempre à nossa mesa, passarinha,
mas chilreia mais mansinho,
mais baixinho: os nossos tímpanos!
assim não faltará a casca do nosso pão,
não faltará alpiste.







NESSA NOSSA LÍNGUA INGRATA









NESSA NOSSA LÍNGUA INGRATA
a chuva (abandono!)
chove defectiva,
nuinha
(afora umas fúrias ou ácidos necessários)


toda redondos
redondinhos pingos
dágua
mal se conjuga


(só mesmo o sol pra irisá-la em coloridos
  ela mesma cinza e poça,
                      chão e pingo)


apesar que desdita na gramática
dessa nossa língua lusa,
ela molha o mundo -
com seu ser de oração pobrinha, sem sujeito
dissolve em vida e luto










    olha por nós 
       chuva prece de tudo